Por Sara Kirchhof
O grande evento que apresenta o que há mais importante na agropecuária canadense não acontece em alguns hectares de terra em um grande campo verde, mas sim, dentro de um espaço fechado no meio da cidade de Toronto, o centro financeiro do Canadá. O Exhibition Place recebe todos os anos a Royal Agricultural Winter Fair. Este ano, o evento chegou à 95ª edição, consolidando sua tradição e levando ao público mais de duas mil competições, desde as mais tradicionais até as mais curiosas e inusitadas, como o peculiar concurso de cabras, ou o de esculturas feitas em manteiga. E que tal uma corrida de coelhos, ou um show de teatro com cachorros? A feira também faz a escolha da abóbora gigante, onde a grande campeã – em todos os sentidos – pesa mais de 600 quilos, ou, 1.322 libras, medida de peso adotada no país anfitrião da Royal.
A Royal Fair nasceu quando, após a Primeira Guerra Mundial, um pecuarista de gado canadense desejou criar uma exposição que seria vitrine da agropecuária canadense. Nem é preciso dizer que deu certo, não é? Hoje, a Royal é considerada a maior feira do mundo que combinada agropecuária e competições equestres internacionais em um espaço indoor. Por lá, criadores, produtores e expositores de diferentes países são declarados campeões e milhares de participantes têm a oportunidade de aprender, competir, comprar e se divertir.
O evento acontece durante o belo outono canadense e, todos os dias, escolas chegam em ônibus e vans lotando todos os cantos da feira, com preferência por aqueles onde estão os animais. Cerca de 20 mil crianças participam do evento a cada edição e o trabalho com elas já começa antes mesmo da feira e segue depois que o evento termina, isso, porque a Royal envia materiais didáticos para as escolas trabalharem em sala de aula, tratando do que será visto durante os 10 dias de Royal.
Há espaço para interação entre o campo e a cidade e, muitas crianças que vivem no meio urbano, têm a chance de conhecer de perto os animais e entender de onde vem os alimentos que elas consomem. Este ano, mais de 5 mil animais circularam pelo local somando todas as atividades espalhadas em mais de 1 milhão de metros quadrados. Na exposição de gado de corte, era possível encontrar raças conhecidas no Brasil e, outras, nem tão conhecidas assim. Também encontramos pecuaristas tão apaixonados pela atividade do campo quanto pela própria Royal, como Murray McLean, que trabalha com 40 matrizes de Angus no interior do Canadá e expõe na feira há três décadas. Ele conta que, por lá, não é comum investir na produção de pastagens porque o clima faz a parte dele para garantir a qualidade do pasto. “A maior parte do pasto aqui não é cultivada, o pasto é composto, basicamente, por grama e plantas daninhas, é simplesmente o que crescer! É raro encontrar alguém que produza pastagem. Sempre foi pasto e, uma vez que você converter esse pasto em outra cultura, não voltará a ser pastagem. O “x” da questão é o feno, que é a forragem, e precisa ser uma gramínea de boa qualidade, é o que ajuda os animais a sobreviverem no inverno”, explica.
Mas atenção, para levar o seu gado à feira, também é necessária alguma dose de realeza. “É preciso se qualificar para poder expor aqui, os participantes precisam ter sido vencedores em outros shows. Por exemplo, o touro anunciado campeão aqui, se antes ele valia 10 mil dólares antes de ser declarado campeão, agora, vale 20 mil dólares”, explica o diretor de Alimentos de Agricultura da Royal, Peter Hohenadel.
O Canadá é um dos maiores produtores agrícolas do mundo, especialmente de cereais como trigo, canola e cevada. O país ocupa a décima posição no ranking mundial de gado de corte. Com aproximadamente 12 milhões de cabeças, a preocupação é em produzir carne de excelente qualidade, é o que diz o diretor de Bovino de Corte da Semex, Myles Immerkare: “Um dos diferenciais da carne canadense a nível mundial é a qualidade de carne que temos e a habilidade de produzir para restaurantes de alto nível”. A empresa é uma das patrocinadoras do evento.
O país realmente não parece estar preocupado com grandes quantidades, inclusive na produção leiteira, na qual o país conta com cerca de cerca de 2 milhões de vacas, a maciça maioria, de raça Holandesa. O país trabalha com o sistema de cotas, controlado pela Milk, a Associação dos Produtores de Leite da província de Ontário, que garante que o preço pago ao produtor não caia e que também não sobre leite do mercado. O negócio parece estar dando certo há mais de 50 anos. Quem vem tentando acabar com esse equilíbrio entre oferta e demanda do leite canadense é o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Através de negociações com o Nafta, o Acordo de Livre Comércio da América do Norte, o republicano vem pedindo o fim das cotas, para facilitar a comercialização do leite do próprio país. Mas na Royal, a Milk preferiu se preocupar com outras coisas, como garantir diversão e conhecimento sobre a cadeia leiteira para todo público. No espaço da associação, pessoas de todas as idades participaram de jogos de perguntas e respostas sobre a cadeia leiteira premiando aqueles com maior número de acertos.
Já na pista de provas equestres, cavaleiros de calibre olímpico competiram no mais alto nível por títulos de campeões reais. Há uma grande expectativa pelas provas. Durante o dia, os jovens mostram todo o seu potencial nas provas e, à noite, profissionais adultos dão show na pista, pista esta desenhada por um brasileiro. Guilherme Jorge é o course-designer que também foi o responsável por desenhar a pista de hipismo das Olimpíadas no Brasil em 2016.
A Royal faz uma ponte importante entre o campo e a cidade enriquecendo os visitantes com conhecimento e diversão. Este ano, 300 mil pessoas visitaram a feira e, mesmo com todos os desafios para se realizar um evento deste porte em um espaço indoor no meio de um centro financeiro, o que todas essas pessoas esperam, é que a Royal Agricultural Winter Fair continue sendo a mesma Royal pelos próximos 95 anos.