A pecuária brasileira tem cenário internacional positivo com câmbio, apetite pelas nossas carnes, oferta de grãos. O que pode atrapalhar são realidades próprias do Brasil: o desemprego, o fim da ajuda do governo federal em dinheiro aos pobres e o baixo profissionalismo da produção de carne bovina no campo. O diagnóstico nasceu da análise feita por seis especialistas que participaram nesta sexta-feira, 7 de agosto, do terceiro dia do ‘Encontro de Confinamento e Recriadores’, o ‘ECR 2020 Digital’, promovido pela Scot Consultoria via web e que vai prosseguir nos próximos dias 12, 13 e 14 de agosto, totalmente voltado ao segmento do Confinamento.
Eles debateram as ‘forças, fraquezas, oportunidades e ameaças na pecuária’, refletindo sobre economia, mercado do boi e de insumos, e as políticas agrícolas. “Os preços agrícolas subiram bastante em um primeiro momento, pela correria das pessoas em comprar. Aí, começaram os problemas. A quebra no fornecimento do food service mundial e frigoríficos sendo fechados por causa de funcionários contaminados com o novo coronavírus no Brasil e em vários países. Porém, o câmbio ajudou a exportação brasileira a ficar ainda mais competitiva, o dinheiro injetado pelo governo federal ajudou aqui dentro e os alimentos permaneceram priorizados pelas famílias”, examinou o economista Alexandre Mendonça de Barros, da MB Agro.
Ele acredita num período pós-pandemia de bons negócios por causa da persistência da Peste Suína Africana (PSA) na Ásia e Europa, a volta das compras de carne pelos Estados Unidos, a volta do food service no exterior e no Brasil e a possibilidade de novos investimentos por causa dos juros baixos. “Mas teremos um tombo de 6% na economia mundial e precisamos enfrentar que temos fragilidades internas. O desemprego muito alto, a demanda interna baixa, o fim do auxílio dos R$ 600, os gastos públicos explodindo, o câmbio nervoso e a produção frigorífica ameaçada pelo Ministério Público e a Justiça”, alertou.
Um cenário bem semelhante ao desenhado pelo analista da Scot Consultoria, Hyberville Neto. “Nos últimos doze meses, todos os preços das categorias de bovinos subiram. Da cria ao boi gordo. As exportações dispararam e ocorreu uma certa ‘barriga’ em abril, maio e junho, mas motivada pela queda no número de cabeças para abate e o consumo diminuindo no Brasil. Porém, a China e as vendas externas em geral foram mais do que compensadoras. E devem permanecer assim pela retomada da economia europeia, o número crescente dos animais confinados no segundo giro e o fornecimento incerto dos nossos principais concorrentes”, avaliou.
O céu azul do boi também deve se refletir no âmbito do milho e farelo de soja. Rafael Ribeiro, também consultor da Scot Consultoria, informou que o preço do milho subiu 33% e do farelo de soja quase 45%. Além de puxarem os valores do soro, da polpa cítrica, do caroço de algodão e DDGS. “O futuro do setor é promissor. A procura pela indústria e a China, que deve continuar procurando nossas carnes. O problema pode ser o mercado interno já que os dois insumos continuarão valorizados em 2020 e 2021, pressionando os setores que usam milho e farelo. Vamos continuar exportando bem e ainda aproveitando as oportunidades oferecidas pela guerra comercial entre os Estados Unidos e a China”, detalhou Rafael, antes de aconselhar os confinadores do país. “Estamos falando de preços altos. Logo, tudo indica que a estratégia de comercialização é fundamental para o confinador comprar farelo de soja e milho daqui por diante”, finalizou.
E se o boi, o confinamento e as vendas externas vão bem, a indústria não pode deixar a peteca cair. “A indústria brasileira é moderna. Temos plantas antigas, mas foram remodeladas e atualizadas dentro dos parâmetros mundiais de exigências. E procuramos a melhoria constante dos animais que chegam dos cochos. Temos um mercado interno forte, que consome 80% do que produzimos, e acesso total aos mercados externos”, analisou o craque da Minerva Foods, Fabiano Tito Rosa. Seguindo o esquema pedido pelos organizadores do evento, na sequência, Fabiano tratou dos pontos fracos dos frigoríficos.
“As ofertas são sazonais, nossa imagem internacional é ruim e temos um parque frigorífico superdimensionado, com um alto custo fixo e mão de obra intensiva demais, com baixa automação. Além de uma desigualdade na vigilância normativa ao longo de todas as regiões do Brasil. Outro problema que pode surgir é o fim da vacinação obrigatória contra a febre aftosa. Assim como a volatilidade intrínseca do câmbio e do próprio negócio”, ponderou o executivo do Minerva, que voltou a apontar mais vantagens do segmento, como o interesse crescente da China, os problemas enfrentados pelos concorrentes e a exploração comercial de novos tipos de gado, dos nichos de mercado e das certificações. “E ainda temos as tendências que são irreversíveis. Casos da segurança alimentar, sustentabilidade, o aumento do comércio eletrônico, da coordenação dos elos da cadeia, concentração em todos os elos, gestão, tecnologia e digitalização”, concluiu.
Certamente, outra tendência obrigatória é que o pecuarista de nosso país precisa subir mais degraus na ‘escada da profissionalização’. “Quase metade dos pecuaristas brasileiros não conhece o próprio custo de produção e não faz nenhuma proteção para o negócio. O hedge é interessante para o pecuarista. Contratos futuros, mercado de opções, termo e Cédula do Produtor Rural (CPR). Primeiro, é necessário ter um diagnóstico de sua empresa rural. Saber o custo do seu negócio. Analisar o mercado, entender o próprio perfil de investidor. E escolher a melhor ferramenta. É previsibilidade, mas é preciso dominar minimamente as ações e entender as características da região onde o fazendeiro atua”, propôs Lygia Pimentel, executiva da consultoria AgriFatto.
E essa segurança oferecida aos empreendedores ganha mais força se houver uma diretriz objetiva e positiva, arquitetada dentro de Políticas Agrícolas levadas a cabo pelas autoridades brasileiras no setor do Agro. “Crédito, apoio à política de preços mínimos, câmbio, juros e inserção internacional. Nossa postura estratégica deve levar em conta nossa produtividade desigual, os novos entrantes. A política agrícola constrói o futuro. E ajuda os empreendedores rurais mais ousados”, decretou Ivan Wedekin, especialista e diretor da Wedekin Consultores.
A tradicional palestra de encerramento do ‘ECR 2020 Digital’, dentro da proposta ‘O que vi e aprendi com as crises que vivi’, desta vez foi apresentada pela ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), Tereza Cristina. “Tivemos um papel fundamental no abastecimento de alimentos para o brasileiro e ainda mantivemos as exportações para dezenas de países, mesmo em meio a uma pandemia. Temos problemas a resolver, é claro, mas como todo setor, como todo país. Trabalhamos demais e não podemos ser desrespeitados. Estamos com o Plano Safra em pleno andamento e muito trabalho pela frente. Pretendemos ser um facilitador entre o setor privado e o mercado. A sustentabilidade está na pauta do mundo e a sanidade também. São os pilares do MAPA como instrumento público da agropecuária brasileira”, resumiu a ministra.
O evento ‘ECR 2020’ da Scot Consultoria volta no próximo dia 12 de agosto, quarta-feira da semana que vem, com o debate envolvendo o tema ‘Pecuária 4.0 se faz com Gestão 4.0’. E o exame de casos de outras áreas para entender de maneira prática a importância da gestão de todos os fatores e como isso impacta no seu negócio. Confira as apresentações:
O verdadeiro papel do gestor
Raimundo Godoy – Aquila
Gestão de operações complexas
Luiz Roberto Maldonado Barcelos – Agrícola Famosa
Gestão de pessoas
Sandro Viechnieski – Starmilk
Gestão de custos operacionais
Fernando Junqueira Franco – Pecuarista
Gestão de dados e Big Data
Arlan Marcos Lorenzetti – Copérdia
Palestra de encerramento – ‘O que vi e aprendi com as crises que vivi’
Marcos Jank – Insper