Estudo que relaciona o consumo total de defensivos agrícolas utilizados nas lavouras brasileiras com a área onde eles são aplicados desmonta o mito de que o Brasil é líder no uso desse insumo e o coloca na sétima posição, atrás de vários países, com a liderança mantida pelo Japão. Quando se relaciona o total aplicado com a produção agrícola, o país passa a ser o 11º do ranking mundial do uso do insumo. A constatação é do professor Caio Carbonari, da Unesp de Botucatu e foi feita durante palestra no Diálogo: Desafio 2050 e Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, evento promovido nesta quinta-feira (30), em São Paulo.
O encontro é uma iniciativa da FAO/ONU, EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, ABAG – Associação Brasileira de Agronegócio e ANDEF – Associação Nacional de Defesa Vegetal, e o objetivo é evidenciar a importância dos avanços científicos alcançados pela agricultura brasileira nas últimas décadas, fator que tem assegurado a continua ampliação da produção brasileira de alimentos, fibras e energia, de maneira a consolidar a posição do país como principal fornecedor mundial de produtos de alta qualidade, seguros e produzidos de forma sustentável.
De acordo com o professor Carbonari, que participou do painel denominado “Mitos e Fatos”, existe muita informação discrepante nessa área. “A imagem que se cria do agrotóxico não tem conexão com a realidade, pois a agricultura brasileira só conseguiu ter o avanço que teve com tecnologia, inovação e o uso de diversos insumos, entre eles os defensivos”, afirmou. “Necessitamos trabalhar com dados e informações científicas para pautar toda a discussão em torno do assunto”, complementou.
Na mesma linha do professor da Unesp falou a toxicologista Elizabeth Nascimento, que tratou do tema “Segurança dos Alimentos”. “Em termos científicos, tivemos um grande avanço nos últimos anos no que diz respeito a parâmetros sobre riscos de contaminação em alimentos. Temos hoje no país inúmeros instrumentos que podem nos dizer, com certeza, quanto podemos comer sem correr riscos. Claro que não existe risco zero e nem segurança absoluta”, observou Elizabeth, lembrando que é necessário ainda um esforço na área de comunicação para esclarecer o consumidor sobre essa realidade.
Sobre o tema “Reflexos da Alimentação na Saúde e Qualidade de Vida”, o endocrinologista Filippo Pedrinola salientou que é preciso se basear cada vez mais em fatos e menos em mitos. “Vivemos uma era que eu costumo chamar de terrorismo nutricional e demonização de alimentos, embasados em pseudociência”. No seu entender, a recomendação básica para ter uma alimentação mais adequada é fugir de dietas da moda, comer de forma mais consciente e evitar estresse.
Outro participante do evento, o presidente do Ital – Instituto de Tecnologia de Alimentos, Luis Madi, abordou as diferenças entre alimentos “Orgânicos & Convencionais”. Baseado em diversos estudos do próprio Ital e de outros órgãos, Madi assegurou que não há evidências científicas que sustentem vantagens nutricionais dos orgânicos sobre os alimentos convencionais. “O resultado disso é que temos um consumidor confuso e desorientado que acaba deixando de consumir alimentos seguros e de qualidade por achar que não fazem bem à saúde. Em relação aos orgânicos, o consumidor compra um produto acreditando que tem benefícios que efetivamente não possui. Ele está sendo enganado”, concluiu Madi.
Além do painel “Mitos e Fatos”, o evento contou ainda com duas palestras que analisou o atual estágio e o futuro do Desafio 2050. Na primeira, o representante da FAO no Brasil, Alan Bojanic, sustentou que os mais recentes estudos da ONU indicam que a população mundial deverá atingir a marca de 9,8 bilhões pessoas em 2050, estabilizando-se apenas em 2100, quando deverá atingir 11,2 bilhões. “Dessa forma, o volume total de alimentos a ser produzido no mundo deverá crescer em 70%, alcançando a marca de 2,6 bilhões de toneladas de grãos. Desse total, 8% deverá ser fornecido pelo Brasil”, informou Bojanic.
Na outra palestra, Carla Branco, Diretora de Relações Institucionais do Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) destacou as ações voltadas para a sustentabilidade que a ong tem colocado em prática no Brasil dentro da agenda dos “Objetivos de Desenvolvimento Sustentável”. “Todas as iniciativas são na direção de uma agricultura mais sustentável, com redução de resíduos no solo e também do desperdício de alimentos”, comentou Carla.
O tema do desperdício foi abordado com mais profundidade em outra palestra proferida por Bojanic. “Temos como meta, até 2030, reduzir pela metade as perdas e desperdícios de alimentos no mundo, que atualmente estão na marca de 1,3 bilhão de toneladas, o que daria para alimentar aproximadamente 795 milhões de pessoas que são desnutridas”, ponderou o representante da FAO no Brasil.
Falando sobre a temática “Produzir com Qualidade e Quantidade”, o presidente da Cocamar Cooperativa Agrícola, de Maringá, Luiz Lourenço, trouxe exemplo de sistemas produtivos que recupera áreas degradadas. “Há exemplos de pecuaristas no interior do Paraná que conseguiram ampliar em até três vezes a produtividade do gado de corte apenas com práticas de recuperação de áreas degradadas”. Segundo ele, a estimativa é de que o Brasil possua cerca de 50 milhões de hectares de áreas que podem ser recuperadas para o plantio.
O encerramento do evento foi feito pelo presidente da Embrapa, Maurício Lopes, que abordou o tema “Caminhos para Chegar em 2030 e em 2050”. No seu entender, o Brasil deve utilizar iniciativas como o Código Florestal ou o programa de Agricultura de Baixo Carbono como uma verdadeira marca de país sustentável. “Temos de mostrar ao mundo que tivemos a coragem de adotar uma política na qual os produtores agrícolas destinam 20% de suas áreas para preservação ambiental. Nenhum outro país do mundo tem isso para oferecer. Essa deveria ser uma marca a ser trabalhada pelo Brasil no exterior”, concluiu Lopes.